sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Gratidão

Festival Gastronômico de Pomerode - 2019

Hoje sim. Agora sim. O coração palpita.
Encontrei aquilo que quero muito fazer para o resto da vida:
Ser feliz fazendo qualquer coisa de que eu ame muito.
Porque só mereço outra coisa se for maior que isso.




domingo, 6 de outubro de 2019

Você é imperdoável.


Tudo está certo como dois e dois são cinco.
Mas não pode haver perdão para o fato de que o jardim floresceu e você não estava lá para ver.

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Enxergar-se

Canela, RS, meados de 2014.


Quanto tempo faz que você faz tudo aquilo que esperam de você?

A pergunta que encontra a qualquer um desprevenido ecoa entre as paredes caladas. Retumbou até que meus ouvidos doessem e me obriguei a escrever de novo.
Um lapso repentino na frente do espelho: tem valido a pena, meu bem?
Procurei a resposta, mas as paredes suspendem o silêncio na eternidade.


sábado, 20 de julho de 2019

For Emma, always.


Hoje acordei ouvindo as lamentações de Adele e pensei como já ouvi tudo isso antes, ao seu lado, os seus longos e lisos cabelos cúmplices. Tenho feito algumas centenas de reavaliações sobre a minha trajetória. Queria deixar claro que você não me escapou sequer um minuto, meu bem.

Lembro-me de sua cara sonolenta pela manhã, quando fazia seu café amargo na cozinha da agência.
Sempre nos amávamos à nossa maneira no chat, trocando toda a sorte de boas indicações de filmes, livros, músicas e confissões. Na ocasião, Adele guiava a nossa descoberta. Era também inverno e me lembro do calor que se desprendia de nossos corpos enquanto conversávamos no banco que beirava o rio, no crepúsculo dos dias. Você acendia os meus cigarros e eu, os seus. Os sorrisos vinham fáceis, cúmplices.

Você se lembra, meu bem?
Eu te contava as minhas dores e você os seus amores. Não era Thabata a moça dos olhos de ressaca?
Não entendo como vocês não se casaram até hoje. Mas deve ser porque a vida precisa continuar o seu mistério e nós temos que aprender a respeitar a nossa alegre ignorância.

Mas você suspirava ao falar dela e eu estremecia no banco, completamente entregue aos seus trejeitos. Sei que houve ocasiões em que eu poderia sentir um beijo invisível entre nós, era uma sensação quase táctil. Porém, nunca nos encontramos descompromissadas nesse banco da praça.

Um ano mais tarde, você me recebeu em sua casa na véspera do vestibular. Como te explicar que nos desencontramos em uma noite tão propensa aos mais intensos pecados? Perdão. Eu recém havia me metido em uma enrascada, das grandes, e ensaiava fidelidade a alguém que jamais poderia me retribuir. Sei que desencontrei seus lábios propositadamente, mesmo tendo puxado seu corpo sobre o meu, rendida. Apenas queria que você soubesse que não foi uma tarefa nada fácil. Que ao relembrar aquele momento, ainda sinto, mesmo hoje, a verdadeira força dele me agitando a respiração.

Para onde vão os sentimentos que a gente aprisiona? Ficam enclausurados dentro de nós e nos aprisionam a eles em uma espécie de remember eterno.


quarta-feira, 10 de julho de 2019

Mercúrio retrógrado


Um feixe de luz solar adentra a minha janela, traz consigo o frio da temporada invernal que se repousa sobre a província. Vagarosamente eu me espreguiço e penso que se tem algo bom na vida de um desempregado é poder prestigiar esse momento tão único.
Levanto-me então na calmaria e na ansiedade: um misto que abala minhas dimensões celulares desde a mensagem do aviso prévio indenizado. As mãos muito frias, as unhas muito vermelhas, os olhos muito azuis e a cabeça cheia de cabelos. 

Após o banho e o demorado café, saio pedalando para o parque. Eu mesma e mercúrio retrógado.
Nunca entendi esse domínio que a força da vida faz exercer em alguns momentos sobre mim. Mas respeito quando ela me chama para resolver antigas pendências, quebrar velhos entraves e me abrir com essa matriarca que agora me ouve, sentada no banco da praça.

Poderíamos jogar xadrez, pensei tolamente. Mas sei que a vida nos reservou esse momento para uma grande faxina. Não sei que tipo de transformações virão especificamente. Ela pede que eu me expresse, que eu conte ao papel os amargos e adocicados da vida. Sempre pensei que as transformações aconteciam para aqueles que ouvem o tom do silêncio, nunca para aqueles que esboçam sonoras palavras. Mas não doeu, exatamente, ao verbaliza-la: cocaína.

Finalmente me livrei do vício. Tive certeza.

Não foi há sete ou oito anos, quando a grosso modo eu evitava entrar em banheiros públicos por conta do cheiro químico que me atiçava as narinas e fazia embrulhar o estômago de ansiedade. Não, não. Foi mesmo aqui, nesse espaço-tempo, onde poderia jogar xadrez com essa pessoa que ensaia toda a atenção ao que digo.

- Cocaína. - E as palavras se dissiparam trêmulas.

Não senti mais aquela vergonha humana em minhas entranhas ou o suor frio de uma confissão. Agora posso até escrevê-la e rir-me dela. A mente até tenta pregar peças, diz-me que é arriscado escrever, o que será que podem as pessoas pensar a respeito? Dane-se diz meu novo ser, com olhos muito reluzentes. Os azuis de meu pai. Um dane-se e um muito grata.



domingo, 30 de junho de 2019

A queda da torre

Então os passos cansados que me seguem até aqui finalmente descansam. E os laços - se algum dia existiram - se desataram rapidamente. Agora restam os escombros para limpar e o verdadeiro trabalho já começou.

domingo, 26 de maio de 2019

não disse o que queria dizer e a verdade é que não tenho nada a lhe dizer, Caroline.


Poucas coisas na vida me são verdadeiramente broxantes. Deixe-me reformular, eu sei das injustiças, da sujeira, do crime de colarinho branco, dos imundos hipócritas que hoje, exatamente hoje para não mentir, foram às ruas bradar apoio ao seu capitão - igualmente sujo e hipócrita, vale ressaltar. Estas coisas me são broxantes por demais. Não há dúvida.
Mas o que quero dizer, devo dizer, se é que posso explicar: poucas coisas me são broxantes diretamente, além do fato de se nutrir afeto por político de estimação. Explico de novo para que você me entenda: estas coisas - as sujeiras do mundo - são do mundo e ainda que não tenha existido um pai em minha vida ou sequer um resquício de fortuna, herança ou qualquer facilidade - muito do contrário, só agressões em famílias, boletins de ocorrência contra irmão por um olho fechado na porrada que me dói na alma até hoje, abandono de segundo casamento maternal, traição e agressões de anos de padrasto e silêncio cúmplice de família machista e ou desinformada à época - ainda assim me considero muito sortuda por estar distante de boa parte das sujeiras mundanas. Mas este texto não é sobre a minha vida.

Quero dizer, eu não preciso comer nada que já tenha ido ao lixo, não busco meu sustento em prostíbulos - e não há nenhum demérito nisso que escrevo, apenas sorte - não durmo e acordo na rua nem morro de frio abandonada em pleno inverno. Não, não. O que me é broxante é algo que me rodeia, eu que tenho muitos privilégios e não posso deixar de reconhecê-los por essa pequena parte que relatei nas linhas de cima. Sim, privilegiada. Ainda assim, nessa vidinha mediana - de novo sem desrespeito à vida, mas por reconhecimento da dificuldade alheias, medíocre então apenas por estar na média catarinense - nada mais que isso - deixo-me broxar por poucas coisas que habitam esse pequeno mundo.

Não carece de tanta explicação, mas se não me manifestasse prolixa não seria eu.
O que quero dizer, deixe-me começar de novo, nesse imbróglio, é que poucas coisas me são broxantes e realmente você assumiu o posto. Mas entenda que esse texto não é sobre você, nem sobre mero desabafo - isso porque jurei silenciosa e para mim mesma na intimidade do meu ser que não escreveria uma linha a quem não merece sequer uma palavra. Não, não. Esse texto não é exatamente sobre você, embora cá as circunstâncias da datilografia me levem a me deitar novamente sobre o que foi a sua passagem em minha existência.

Esse texto é sobre palavras e encontros de estranhos, é sobre esse termo individualmente confuso e socialmente cortejado, atrelado à boa parte de relações superficiais mantidas por, concorde comigo, trejeitos socioculturais... esse olá, tudo bem? Essa mania incontrolável de "fazer contato", ser educado - mesmo quando não se almeja verdadeiramente -, mas por puro trato social, porque assim jogam as regras no tabuleiro humano e nós - peões que somos, porque todos são peões em algum momento, nem que seja na hora da morte - nos debruçamos cheios de árdua formalidade, maquiagem quase maquiavélica e funcional para nos dizer - a voz medíocre como todo o resto - "olá, como vai" sem sequer intencionarmos saber como vai o outro, de fato. Não há sequer temor por uma pergunta que já conhecemos previamente a resposta: "tudo bem e você?". Em alguns casos haverá, no máximo, "obrigado por perguntar", entre os mais aperfeiçoados da arte, no seu caso dissimulado - permita-me acrescentar. E você ousou me destinar estas palavras. Você fez isso, não bastasse tudo o que já havia feito - ousou cometer crime maior que é a declaração de que permaneceremos seres estranhos, avessos, indiferentes. Como se nunca houvéssemos nos olhado e tocado fervorosamente, alma contra alma, sua boca na minha, a língua e a carne úmidas em uníssono. Como se você não me dissesse, a contragosto, três anos depois que tudo o que vivemos foi uma mentira. As dificuldades que enfrentamos, para suprir um papel que você criou para não precisar me apresentar à sua família em um teatro ao qual eu me submeti com você, como mera coadjuvante, tão à mercê, ingênua e doente de ilusão. Não é possível - ou melhor, é sim, quando me lembro do trajeto dessa história e do seu papel de boa atriz - porém me é de direito exclamar que não é possível que até esse crime você tenha cometido!

Tal foi a minha surpresa - não apenas pelo encontro inesperado, mas pelas suas palavras - pense em um broxar rompante - como uma verdadeira e inesperada chuva de verão mas sem a parte nostálgica das infâncias sorridentes - pense que para tal flecha sorrateira em meu peito apenas consegui murmurar "bom dia".
Foi a maldita da educação que recebi de casa, gostaria de dizer que foi de minha mãe, talvez tenha sido, mas só consigo lembrar de minha 'vódrasta' muito generala - esposa de militar - a dar toda a 'boa educação' na base de tapas, puxões de cabelo e olho ardente. Foi essa maldita conduta social imposta em regime ditatorial que me fez responder tão injustamente àquela flecha em meu peito.

Quando dei por mim, da injustiça que havia cometido comigo mesma por responder-lhe "bom dia", os olhos torcidos de verdadeira dor, imaginei mil outros encontros e mil outras respostas. Certeza de que nenhuma delas agradaria a você, mas seria um alívio vomitar toda essa náusea que sinto de quando vejo você dispor a outra pessoa tudo aquilo que me negou um dia, com todas as escusas e falas ensaiadas. Casamento na cidade alemã, passear com cachorro no parque, jantares românticos à noite e toda sorte de programa de verdadeiros namorados... vomitarei, por certo, antes de findar esse texto que também não tem a pretensão, absolutamente, de ser sobre você, volto a repetir.

Repassei novamente em minha tela mental as discussões que criei para me abrir com um ser que jamais esboçou ou esboçará um pedido sincero de desculpas - porque você simplesmente não se importa - e não quero me fazer de magoada por aqui tardiamente. Eu tive um relacionamento abusivo, com uma figura completamente tóxica e manipuladora sem me dar conta disso e hoje me equilibro em meus porquês para amenizar minha sensação de culpa. Não, já se passou dois anos e não será agora que despejarei qualquer coisa sobre esse incidente que foi você em minha vida, tão visceral, falsa e imoral e vários outros adjetivos que deixo-a livre para completar.

Não gosto de me demorar num texto que é sem amor e ainda em tom de broxe, mas não era bom dia que você merecia ouvir, não. Não. Penso que a resposta mais sincera e sensata seria: nenhuma.
Não tenho verdadeiramente dentro de mim nada que valha alguma coisa para você, não tenho mais nada a lhe dizer a não ser tudo o que aí está e permanecerá no tempo como mais um dos rompantes amargos da vida e a cruel sensação de que seremos eternas estranhas, angustiando toda a má sorte de um reencontro.