sábado, 24 de dezembro de 2011

rememorar.


Uma vez tendo visto teu rosto, é preciso voltar os olhos novamente. Uma vez tendo ouvido o tom suave da tua voz, é necessário que se a ouça mais uma e outra vez, consecutivamente.
Não se pode determinar o significado do impacto que me causas quando segues andando, és de longe da vista a coisa que se quer próxima e por inteiro. És próxima o que o que se deseja mais estreito, mais unificado, mais como esse abraço que agora te dou  de alma e corpo inteiro.

Cada encontro é um passo para o que advém, cada palavra dita e não ouvida ou não dita mas vista, é força que te atrái de novo para essa surpresa de me conhecer, quando penso que toda essa empatia indica que já nos conhecemos bem.
Não me resta nenhuma dúvida, por menor que seja, de que o que sentes é também o que eu sinto, e que logo começas a entender, pouco a pouco, que nem as palavras ouvidas nos são necessárias, que o discurso entre nós torna-se supérfluo, apenas empatia escrita, comunicada.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

é pouco tempo.

vê? um dia ainda é muito pouco, quando uma noite não te bastaria.
sentes? é mais um alguém que se vai levando de ti os números inteiros.
eu queria te dizer, menina do espelho, junto ao ouvido, o que sinto e o que vejo,
mas levas essa caminhada pra longe de mim a cada nova manhã...
Buscas com que te ocupar, procuras a quem te ocupe,
distante do que já te disse e volto a dizer:
nao é por tua culpa, eu te juro, é só por tua ignorância.
e nao é culpa tua que estejas envelhecendo,
é só o curso natural das coisas.

Toma para ti todas as marcas que foram deixadas porque nada se pode levar além delas, leva embora contigo, mesmo para debaixo da terra. Diga que o é, que é suficiente, mesmo sabendo não sê-lo, invente.
Segura firme nas mãos esse vento que soprou lá fora,
quando se olharam sem se ver, lado a lado, e o dia foi tão pouco.

"and all the roads we have to walk are winding
and all the lights that lead us there are blinding"

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

de pequena.

uma fotografia.  Eles estão prestes a capturá-la, essa imagem que eu sou, tão pequena, tão à deriva, estes meus pezinhos usando os sapatinhos que me puseram, esse vestido branco impecável, essa longa fita em volta do pescoço.

Isto é o que vejo: todos chamam Michelle, olhe, Michelle aqui.

E eu só consigo mexer os dedos das mãos enquanto mantenho o rosto sisudo de um futuro próximo. sinto ainda essa leveza de quem não sabe que existe, sinto que colocaram esse cobertor por baixo dos meus pés, dizem que é para que eu não fique com frio, asseguram-me e beijam-me nas bochechas.
O atrito do beijo na face me incomoda, acho que torço um pouco a boca, mas mantenho estes olhos compenetrados.
Dizem então, como em respostas aos olhos, são dois lagos azuis profundos, o mundo há de os ver, serão sempre precisos, mesmo magoados.
Não me lembro de ter pensamento. Tenho dois anos. Dois anos. Não me é o bastante.
Tenho estas sensações, que antecedem ao pensamento, tenho uma vaga ideia do que é a vida, e mesmo assim tudo continua sendo um sonho distante...

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

quase, amor.

Mas era porque estávamos extenuados um do outro que continuávamos sendo exaustivos. Era porque já não suportávamos não poder ser além de insuportáveis, que seguíamos com olhos faiscantes e palavras ferozes.
Obviamente era porque precisávamos tanto ir além e não podíamos, necessitávamos desse contato corporal, dessa paixão violenta ao passo que, impedidos por nossa moral e sociedade, nos odiávamos um pouco mais, dia-após-dia, em lugar de amarmo-nos como fomos levados a crer que tinha de ser, por nossas vontades mais inexcrupolosas, ou amantes ou odiantes um do outro.
Essa idéia era fixa, intransponível, era um precipício que nos levava ao desencontro carnal.
Jamais nos foi possível transcender a ideia sólida do casamento, do que ele representa social e espiritualmente, essa lei divinal, essa autoridade imaculada.
E era para nos vermos, era. Então nos víamos, mas tocávamos pouco um no outro, era proibido. Ouvíamos então atentos e moribundos, os nossos suspiros e as nossas palavras, porque eram os nossos suspiros e palavras que tínhamos unicamente.

Duas vezes nos beijamos, duas vezes, e cada um caiu no escândalo de seu próprio martírio.
Esse tabu, devo dizer, é que me impelia a tornar aqueles poucos beijos eternos, antes de ter de transformá-lo, o amor, este amor aí, em algo insignificante, tão banal quanto esta escrita que agora, de certo a ti como a mim, me acomete como um sonho distante, uma confissão negligenciada pelo fluir do tempo.
Digo estas coisas porque é preciso lembrá-las de tempos em tempos, é necessário que eu me lembre de onde vêm certas cicatrizes, certos acontecimentos.

Hoje este vento que me remete é um grito agudo e rebelde por esse amor transformado no acaso. Fala em mim essa voz da revolta, a qual cada verbo não dito no passado me estremece e expõe essa minha indecência moral.
Diante dos homens, da sabedoria falsa e inútil dos homens, eis que me envorgonho unicamente de não tê-lo amado, de não tê-lo sentido junto ao meu corpo, de não tê-lo dado essa carne ardente que tenho entre as pernas, quando lembro de tudo que ainda não vivi...

sábado, 15 de outubro de 2011

Aí eu disse quem tem medo é você.



-Mas veja, garota, já tudo é tão pequeno nessa cidade, tudo é tão estreito, tão aprisionante, que a gente vai percorrendo todos os espaços do corpo numa histeria que dura uma eternidade.

-E não se pode correr adiante, depois desse limite de espaço.

-Então você voa, voa longe com o pensamento. Você escolhe de novo dar essas mãos ao vento. E é o vento que te leva pra longe.

-De novo com essa estória de voar?

[tempo]
Penso, depois respondo:

- de novo, querendo inventar vida nova.

- Você nunca está contente com nada, eita egoísmo! Vai acabar sozinha. Não tem medo, não?

-Medo de quê, cara?

-De ninguém te aceitar com essa liberdade toda, de ficar sozinha.

- De ficar sozinha, não. Tenho é muito medo de não ser feliz.
[...]

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

hoje você vai GRITAR aqui dentro.

Hoje, cada célula do meu corpo ecoa teu nome, o som que esse nome produz, o frêmito dessa impaciência, da cólera advinda da saudade.
Estou sempre aguçando essa falta em mim.
Serei ainda mais profunda para atingir a realidade, pendendo ao real romantismo colerizado que hoje me assola.
Cada extremidade do corpo reproduz essa saudade, replica essa memória que guardei salva da mudança dos dias.
Essa proporção toda, essa memória incandecente que flui livre e contínua transborda dos meus olhos para fora, dos meus ínfimos poros, de toda a epiderme e o corpo, assim aos gritos, dói. Dói como dói uma laceração qualquer ali no joelho da criança que caiu, lá no braço do rapaz acidentado. Dói como uma célula rebelde que cresce anormal e pegajosa. É como a crença na dor, como ela faz doer, com essa capacidade mortal.
É essa dor que me leva de volta a você, essa dor da saudade é o ponto de partida.

Hoje, dominada por essa dor, ando nostálgica, tropeçando nas palavras, nos paralelepípedos da cidade, ali onde tantas vezes quase acidentada, tornei a viver.
Dessas emoções sou escrava, sou de novo liberta e torno a aprisionar o que em mim agora acontece pouco: é esse riso trêmulo e solto que a boca dá, quando o corpo ainda repete os fantasmas do passado.

domingo, 2 de outubro de 2011

um abraço teu faria meu mundo ruir agora.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Eu ando tão down e calma e perigosamente entorpecida e.

- Vem que a noite a se aproxima, que o vento tornou-se muito frio lá fora, que.
Mas ela quer discutir, ela quer manter as coisas no lugar desconstruindo as indas e vindas desse relacionamento. Eu vou te desconstruir, ela diz.
- vem, meu bem, sem dar socos no ar – respondo-lhe sorrindo.
Ela diz vamos resolver tudo primeiro, temos que conversar, não se pode fingir que não há nada de errado.
E eu cansada assim de ter de resolver algo que já está resolvido, adoeço na vertigem de sentir-me só noite adentro.
Porque detesto fazer caso do que tem de ser tão simples, canso no meio dessas discussões, as mesmas entrigas mesquinhas que nos fazem andar em círculos.
Explica-me, andar em círculos pra quê quando não se está dançando?

E esse amor aí todo luminoso, querendo e brigando por espaço no quarto adormecido, deitando-se ao meu lado levianamente, é como abril despedaçado, é como uma nuvem que não chove nesse mundo de lágrimas temporárias, lágrimas de riso quero dizer.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O amante (misturando as pessoas do discurso) - texto de Gisélle G. Olimpio

Pulsa o coração enquanto o sangue corre em fios escarlate através dos braços finos e alvos que sempre mantêm a peculiar aparência da aristocracia.


O que quisera ser, não importava mais. Os pedaços de si mesma não se poderiam fundir, nem que a medicina pudesse reverter, e podia, havia entre os cacos um ser que agonizava em profunda melancolia a decepção da suavidade do amor.

Você vem, e vindo não se dá conta do mal que me pode fazer, quando anda solto com um rumo desconhecido, quando se depara com escolhas pré-realizadas, quase óbvias, onde a incerteza é a convicção de que não serei informada da real vida que lhe sobrevém. Os fantasmas que assolam minha mente parecem reais, tal como existe esta escolha que a ti compete preferir. A alternância é a afirmação de uma virtude que se considera certa, é uma convicção de ser ou não ser.

Os passos levam o teu corpo, é quase a hora da despedida. Vês, através de mim, que a atitude de me ter é tão sublime quanto um lago negro, em proporções harmônicas o corpo imprimi fortes movimentos, o que suscita um temor irracional. Flutuas neste lago através do meu ser, mas desconheces a profundidade da situação. Diz a lenda que há monstros nestes lagos, e nesta vasta extensão de imprecisão é que acontece o ápice de um amor que extravasa a luxúria corporal, enquanto as mãos se entrelaçam e a carne arde. Solícito, queres ainda mais de mim, muito além do corpo que me leva, queres o meu interior em um mergulho em que ignoras o pavor que a inundação pode causar.

Aprecio a lubricidade do meu ser, o que pode até ser um sinal do frescor que ainda me ronda, mas também isto é vaidade que se dissipa em um momento qualquer como se fosse uma aparência ilusória.

Eu não quero sangrar até a morte, eu quero a vida plena! Tome tudo de mim com fortes sensações enquanto o domínio da carne nos sobrevém, mas tenha algo além deste instinto físico. Comove-me como um membro de família reinante, com a cordialidade e o afeto que de ti desejo, sempre; em profunda admiração e amizade, com a devoção de dois amantes.

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quarta-feira, 27 de julho de 2011

Paradoxal ou confissão ou vacilar

   Escrevo um livro ao passo que enquanto escrevo, nada é realmente escrito. Está tudo aqui, na ponta dos dedos à espera do papel, mas como é difícil organizá-lo, como é substancial que toda essa pausa em não escrevê-lo regularmente é cada vez mais imprescindível para a existência desse livro. Paradoxalmente nada é escrito, novamente afirmo, nada é deixado no papel dias a fio.

   Uma vez mais acendo um cigarro, eu que já havia deixado de lado o tabaco torno a tragar, fumando distraída procuro pelo café. Trôpega, vacilo entre os verbos e os cigarros acesos. Este rito já me transformou em subproduto do livro, já me tornei subjugada por essa estória que, dentro do tempo de acontecer, não acontece.
   Mas torno a escrever e a fumar, quase sempre torno a fumar. Abandono a escrita. Ando a passos curtos nesse quarto que me aprisiona porque não tenho para onde levar um livro que não existe e que contraditoriamente me pesa nas mãos. 
   A impaciência me faz andar também pela cidade. Às vezes ando por essa cidade como se realmente não a conhecesse. Paro em becos desconhecidos, traço palavras nas paredes como se fosse dessa condição a vândala, a depredadora do patrimônio público, do livro que não acontece. É tudo poesia. Uma vez no quarto volto a escrever o livro, uma vez mais acendo um cigarro, nunca concluo um capítulo, às vezes não fumo o cigarro até acabá-lo, parece-me evidente que nunca concluí de fato uma frase de impacto na vida, tamanho o efeito que a ausência do livro me causa.
   Por um tempo esqueço esse livro, essas palavras selecionadas, sem fazer conjeturas. Está mesmo um dia bonito aí do lado de fora, torno a sair, a andar a esmo como quem escreve sem ler o que está escrevendo. Então retomo a escrita sorrateiramente e o livro vai se tornando sólido nesse paralelo de não existir.
Frequentemente este ciclo se revive, estou à mercê do livro imaterial.
Vê? De algum modo já me tornei personagem desta narrativa.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

inverno

Menina, junta estes cacos aos teus pés. Vamos cola-los de novo.
Menina, junta estas pétalas das últimas algazarras, faz um vaso de flor.
Deixa essa dor desprender do peito, para não doer à toa nas esquinas da vida.
Espalha pelo quarto essa vontade reinventada,

                                          Pinta o teto de azul.

Esquece das palavras de angustia
e lembra que é sempre frio no inverno,
                                       quando se sai sem amor.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Porque me dói.

Edgar. Parece que já foi há muito, muito tempo. Como um sonho distante. Você fecha os olhos e está sobre uma cama com suas mãos quentes no rosto. Ele tem a pele macia, eu sinto, quando suas mãos tocam meu rosto, eis tudo o que sinto. A respiração é pausada, mas de um controle disfarçado ou conquistado a muito custo. Já não sei ao certo.

Com muito esforço eu me recordo. Ele diz feche os olhos, você os fecha. Sim, é como um sonho. Vejo como em um sonho, como em uma nuvem de fumaça de cigarro aceso, vejo que o quarto está vazio. Edgar e eu conversamos, aqui somos amigos, somos dois elos que nos ligam para deixar de ser, mas este conhecimento não nos pertence. Também nada mais nos pertence, simultaneamente aos dois, que este momento, em toda a vida. Nenhuma outra vivência, nenhuma outra palavra dita, porque este é o momento primeiro que deixou de existir após ter sido cumprido.

Com dificuldade retomo: deveria haver outras pessoas, sei que deveria, mas eis o quarto vazio, vazio também de nós dois. Destas pessoas já não sei, creio que saíram para o passeio da manhã, para algo que não me cabe.

O riso dele é suave ou é a luz amarela por sobre as coisas do quarto. Vamos, feche os olhos ele diz, repete até que se cumpra a sua vontade.

Fecho os olhos. Espero. É como um mar branco, como um grande lençol por sobre os olhos, como esse bloqueio mental que agora me abate. A memória me falha aqui.

Não há ninguém nesse quarto. Ninguém acende cigarros.

sábado, 9 de abril de 2011

Depois do Começo.

Eu tinha sentido, eu tinha captado essa palavra que tu não reinventavas, que estava ali, que se fazia presente no discurso dos olhos controlados.
Eu tinha percebido entre os odores do teu corpo maciço e as tuas mãos insistentes. Não obstante eu te disse não te reinventes à minha frente, mas quando durmo. Porque acordar de manhã e ter estes olhos já mudados é de certo a ti como a mim desolador, mas mil vezes mais aceitável que vê-los mudar diante das mãos, impalpáveis e certeiros.
Não importa o quanto tu experimentes, o quanto eu te queira mostrar, estamos já tão distantes nesse abraço caloroso que chegar mais perto é inevitável.
Veja que é abril, veja como eu enxergo, como deve ser visto. Olha com estes olhos meus. Lembra-me muito quando eram dela todas a minhas palavras de amor, de quando nossos corpos se amavam na urgência da vida, faz-me querer isto de novo sempre.
E é abril de novo, só por isso vou sorrindo meus dias inteiros...

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Souvenir de abril.



Nem te disseram, os olhos estúpidos, quem estava lá te observando. Nem finas margens de lembranças ressaltaram as ondas do teu pensamento, nem fixaram as pétalas das flores no teu ar o cheiro de quando eu estava lá. De forma que nada te toca sem que peças por favor. Nada te preenche nem alcança sem que realmente o queiras. E assim posso ser passageira tanto para ti quanto rápido quiseres que o seja.

Atravesso a cidade inteira sozinha, dando espaço a esse vazio que fica depois do prelúdio dos amantes histéricos, permitindo que a curva do rio afogue as marcas da tua pele em meu corpo, que o cheiro e o sabor da tua boca seja gasto em cada cigarro aceso, que os nimbos acinzentados inundem os meus olhos aflitos.
É assim que se morre segura e esquecida, um pouco a cada dia...

terça-feira, 15 de março de 2011

Quem é o inimigo, quem é você?


Quando eu termino e tu começas, esse discurso tão bem ensaiado, somos dois protagonistas desarmados, vivendo dos nossos falsos amores e bens-querer.
E quando tu, distante e perplexo, observas os meus passos sumindo nesse horizonte nebuloso, calculo que não é o bastante para cobrir esse nada que fica aqui, quando te deixo só, para estarmos a sós, sem esses corpos em conflito constante.
Como não bastasse essas  falas, explicas a sentença usando essas palavras doces, a frieza em voz de veludo, deixando meu corpo em estado febril, e mentes, dissimulas, argumentas as tuas agressões, as discussões, as temporárias afinidades entre esse meu ir e vir de lugar nenhum em tua companhia, uma lembrança que é irrefutável agora, que vai assombrar por um longo tempo. Culpas a mim e aos que a mim se uniram, extrapolas a razão usando um falso sentimento que já não te cabe mais. Ouço tudo atentamente, tendo o cuidado de não te contrariar, para não gerar motivo de perguntas retóricas nessa torrente que salta da tua boca para a minha, em profusão.
Então prossegues, discursas, aumentando a escolha das palavras, contracenas tão bem.
Discursando, não te escapas de mim porque não o percebes, mesmo não o querendo, te rendes momentaneamente e és meu, em redenção a esse sofrimento da impossibilidade de sermos dois, pacíficos embora esgotados.
Mas te empenhas em erguer estas barreiras, manténs o erro destas mesmas limitações que levei dois anos para pôr abaixo. Estás te engrandecendo por nada, ou por mais um punhado de falsas verdades e te acreditas correto e justo nesse teu mundo de significações. Temo por ti, por esses olhos fechados e essa boca entreaberta, temo em grande parte, porque nesse ocaso dos meus diálogos desgastados, já se me escapa o dia em que te encontrarei sorrindo e delirando de saudades,  cheia de vontades por nossos desencontros certeiros; e dizendo que já não me ouves, explicando-te pacientemente que a comunicação tornou-se impossível entre nós, confesso-te antes de pensar em ficar, que já é tarde demais para falsas desculpas, que já não compensa mais um beijo nesses lábios de Judas que tens.

sexta-feira, 4 de março de 2011

sobre tudo e nada.

É verdade que ainda não desfiz teus passos pelo quarto. Ainda não recolhi a roupa que foi tua temporariamente, não juntei teus cabelos caídos, ou expulsei teu perfume que teima em presença sobre o travesseiro e me debocha.
Ainda não desfiz essas malas de idéias, nem de horrores dessas brigas tão inúteis. E tampouco abri a janela pra espalhar esse meu desassossego que me mutila minuto a minuto. Não lavei essa minha cara de desordem, nem tirei teu gosto do que me é mais íntimo no corpo - algumas marcas viram tatuagem, não é?
Quando você se foi fiquei como que estável, paralisada nessa minha rotina de não-você por todos os cantos. Hoje, estática, escolho entre pontuar essas linhas ou lábios vivos mais dóceis.

Não é de ti que advém a decisão, mas da minha dor que a cada dia se espalha por todos os nervos do corpo e me impossibilita. Os meus lábios tremem de novo, cada vez que sem ti, nessa impossibilidade de tornarem-se um elo, se retraem tímidos em sua contrariedade e me causam esse misto de medo e compaixão.

Para não virar escárnio de minha própria condição imaginária, eu os devoro. Com essa mesma dor que hoje tu, ausente, me causas, devoro os meus lábios em bocas alheias.




sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

. E é tudo nosso .

Quando falas de mim e eu de ti, mesmo que simbolicamente, oculta ou espalhafatosa, falamos de nós, das nossas palavras, dos gestos contidos nelas. E quando falamos de nossas paixões e do quão elas se tornaram cruciais para nossa existência aqui, de nossas atitudes, de assuntos triviais, mesmo considerando esta hipótese, a trivialidade dos mundos, das vidas circundantes, é como dizer eu amo esse texto, eu amo o que ele representa em mim por causa de ti, do que significamos para os dois lados da moeda, e além disso, do que somos tão cúmplices até quando distantes assim, entre os verbos soltos.


Sei que se falar aqui por enigmas estarei melhor me reportando a ti, pelo que vejo quando me olho no espelho, ao passo que me espias daí, a outra face. É esse sorriso que acontece só de imaginarmos, como quando tu sorri só de ler e saber, é essa canção aqui e aí dentro que faz toda a diferença, que simplifica tudo e coexiste. Então não me desculpo quando teus passos são apressados porque minha boca se move sem falar nada e mesmo assim continuamos nos entendendo. Sem muito tempo de te acompanhar, porque caminhas bem à frente, vou dizendo baixinho logo atrás: “aonde tu fores, eu irei”, sabendo que de um jeito ou de outro e é tudo nosso.